07 setembro, 2021

   Esta bandeira também é minha porque Sepé Tiarajú defendeu seu povo contra a colonização dos espanhóis e portugueses.

Esta bandeira é minha porque os quilombolas resistiram e merecem ter o direito de preservar sua história.

Esta bandeira também é minha porque Zumbi dos Palmares deu uma lição de vida ao acolher todas as pessoas excluídas, sem discriminação.

Esta bandeira também é minha porque Dandara resistiu e não quis voltar à sua condição de escrava.

Esta bandeira também é minha porque Chico Mendes defendeu o meio ambiente, os seringueiros e a Amazônia.

Esta bandeira também é minha porque Irmã Dorothy era contra o desmatamento da Amazônia.

Esta bandeira também é minha porque Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro e Paulo Freire defenderam uma educação para todos, libertadora e transformadora.

Esta bandeira também é minha porque mulheres e homens como Solange Lourenço, Lydia Monteiro, Honestino Guimarães, Vladimir Herzog e tantos outros deram a vida para que este país pudesse viver em democracia.

Esta bandeira também é minha porque Marielle Franco lutava pelos negros, pelos pobres, pelos LGBTQIs e por todos que amam este país.

Portanto, esta bandeira é de todos e todas que lutam por um país democrático, mais justo e cheio de amor.

12 janeiro, 2019

A esquerda on line

Parece que a esquerda brasileira esqueceu como se faz o bom combate. Hoje, a militância parece ter sido substituída pelas redes sociais. O militante atual se contenta em postar fotos e vídeos no Facebook, mostrando reuniões intermináveis com outros militantes, que também não perdem a chance de compartilhar suas selfies.

Iludidos pelo modernismo revolucionário, acreditam que a revolução vai acontecer pela internet. Enquanto isso, a direita se organiza nas igrejas pentecostais, reunindo jovens e convocando-os para sua cruzada celestial.

Resta muito pouco da militância tradicional, aquela que realmente se envolve com movimentos sociais, como o MST, o MTST e outros, que lutam para tirar os mais pobres do flagelo social.

O grande debate sobre organização social migrou para a esfera acadêmica, com grandes diagnósticos sobre a crise brasileira e mundial, mas distantes da realidade do povo: das periferias, das ruas das grandes cidades, dos assentamentos da reforma agrária, das populações ribeirinhas e dos atingidos por barragens — todos abandonados pelos governantes.

Esquecemos que a luta precisa estar próxima do povo, na base da classe trabalhadora: desempregados, endividados, sem transporte, aqueles que realmente precisam. A verdadeira revolução só existe se os debaixo estiverem organizados. Sem isso, fazemos apenas de conta que lutamos.

Hoje, a esquerda brasileira é a esquerda do Facebook, do Instagram, do WhatsApp e do Twitter — e parece ter esquecido das organizações de base.

08 março, 2016

FERNANDEZ, C. B. e GUIMARÃES, J. F. O. Redes de assistência social. Ser Social, 16ªed, 2005.

Resumo: Pretende-se identificar neste artigo a pressuposta rede de atendimento da Política de Assistência Social no Município de Porto Alegre. Para tanto, elegeu-se a experiência de implementação da política viabilizada pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (FASC) no período de 1992-2004, que corresponde às gestões designadas administração popular. Esta reflexão transita entre concepções teóricas e empíricas de redes de atendimento na busca de apreensão de suas aproximações e distâncias. Discutir redes de assistência social é, sobretudo, contextualizá-la, considerando suas relações internas, locais, regionais, nacionais, sociais, econômicas e de classe. Nesse sentido, será abordada a questão da assistência social, a relação entre ações assistencialistas e emancipatórias e o atendimento em “redes” na experiência da gestão da política municipal de assistência social.
Palavras-chaves: assistência social, cidadania, emancipação, participação popular e redes.

NETS OF SOCIAL WORK
Abstract: The present article searchs to identify net of attendance of the social work politics in the city of Porto Alegre. Therefore, it was chosen experience of implementation of the politics realized for the Foundation of Social Work and Citizenship (FASC) in the period of 1992-2004, that it corresponds to the appointed management’s popular administration. This reflection transits between theoretical and empirical conceptions of nets of attendance in the search of apprehension of its approaches and distances. Speak about net of attendance of the social work is specially considering its internal relations, places, regional, national, social, economic. In this direction will be augmented, the question of the social work, the relation between of the social work and emancipation and the attendance in "nets" in the experience of the management of the municipal politics of social work.
Keywords: social work, citizenship, emancipation, popular participation and nets;
  
APREsentação

Este artigo teve origem em debates sobre a distância existente entre o meio acadêmico e as ações do cotidiano, entre os que pensam a assistência social e os implementadores.  Pressupondo a ausência de dicotomia entre teoria(s) e prática(s) - ambas se alimentam mutuamente - nos dispusemos a desenvolver um esforço de aproximar a teoria da prática e a prática da teoria. Nesse sentido, envidamos esforços para refletir sobre as configurações das redes de atendimento da política municipal de assistência social nas gestões da Administração Popular[1] de Porto Alegre, num contraponto a diferentes concepções de redes, proporcionando o debate sobre as chamadas redes de atendimento. Nossa intenção é identificar aproximações e distâncias entre concepções teóricas e empíricas de redes - as que partes da compreensão e vivência dos atores envolvidos.

Assistência ontem e hoje
A assistência tem permeado historicamente as sociedades como forma de ação solidária entre os homens, visando a amenização de situações aviltantes a sua própria existência.  A chamada ajuda aos pobres desprovidos de mínimas condições de vida, pode ser sinônimo de caridade, filantropia desenvolvida pela igreja ou sociedade em geral. São protoformas da assistência. Na sociedade capitalista pode ser um instrumento utilizado pela classe dirigente ou Estado para conter os avanços dos movimentos reivindicatórios populares, conjugado as pressões exercidas pelos trabalhadores, sendo assim, o produto de conquista social, embora não apenas. É importante conceber a assistência em sua interação com a dinâmica dos movimentos sociais, do Estado, do mercado, das expressões da pobreza e da exclusão e da participação popular que atravessam a sociedade. As abordagens teóricas não conseguem apreender, explicitar essa dinâmica da realidade, contudo, é necessário um exercício constante que possibilite capturar momentos do real. Com efeito, a assistência, sua forma de trabalho, está inserida num contexto sócio-econômico político e cultural que possibilita diferentes versões sobre o conceito de assistência, conforme os diferentes estudiosos e os formatos ao longo da história social.
Em um passado ainda recente, anos 30, assistencialismo, filantropia e assistência se confundiam, eram vistos como sinônimos, sobretudo, no meio político e social. Contudo, o avanço nas discussões e ações assistenciais, associadas às mobilizações de segmentos da sociedade e Estado, na luta pela configuração da assistência como direito e não benesse, produziram modificações profundas na compreensão da assistência e conseqüentemente na luta política por uma alteração do seu estatuto no Brasil.  Se nos primórdios do século XIX assistência era prerrogativa de “moças boazinhas”, de damas de caridade ou da igreja, no início do século XX, as demandas impostas pela sociedade, como as pressões do proletariado, a criação dos sindicatos, entre outros, passa a exigir do Estado uma resposta a chamada questão social. O assistencial vai adquirindo novas conformações, numa dissonância entre os interesses do Estado de preservação da estrutura capitalista e as demandas da população, ao mesmo tempo, se constitui como espaço de articulação de pressões da classe trabalhadora no atendimento de suas necessidades. O assistencial é neste sentido campo concreto de acesso a bens e serviços, enquanto oferece uma face menos perversa ao capitalismo. Obedece, pois, a interesses contraditórios, sendo um espaço em que se imbricam as relações entre as classes e destas com o Estado.(Yasbek, 1993 p.53).
 A assistência social como espaço regulado pela relação entre classe dirigente, Estado e população desprovida de acesso a bens e serviços, assume historicamente novas configurações.  Num passado ainda recente, sobretudo, no período do regime militar, prevalecia um padrão conservador, ratificado na própria legislação e nas ações estatais e societárias, que a considerava como algo residual. Hoje, cenário pós Constituição Federal, o país emerge num processo de democratização em que assistência, vista como política pública, procura romper com a tradição histórica conservadora. A política visa à garantia de direitos ao cidadão e não de um programa de assistência. Para tanto, se requer a participação da população, nas instâncias de elaboração e formulação, bem como no controle da política de assistência social, que pode ser assegurada quando se trabalha de forma articulada entre o Estado e a sociedade civil, visando à constituição de uma rede, capaz de construir uma nova formulação da ação da política, rompendo com a lógica conservadora de atuação isolada. Esta idéia pode ser impulsionadora de novas formas, estratégias que legitimem o processo de participação.
O cidadão deve tornar-se sujeito das conquista sociais, contribuindo para a consolidação da cidadania e de sua emancipação, embora não faça isso isolado de uma estrutura, de relações de classes, passando a exercer um papel fundamental enquanto sujeito. Mudanças podem ocorrer a partir do sujeito e da estrutura, do subjetivismo e do objetivismo, na tensão dialética entre o velho e novo modus operandi proposto pela política de assistência.

Estado e Pobreza
O Estado brasileiro vem modificando historicamente sua forma de enfrentamento a pauperização da classe trabalhadora e à necessidade de inserção dos excluídos do mercado de trabalho.  Desde o reconhecimento da questão social, como legal e legítima, até a criação de um sistema de proteção social, ainda que seja com políticas focais, fragmentadas, superpostas, o Estado tem respondido as reivindicações populares. Isso ocorre no limite da reprodução da desigualdade social na sociedade brasileira. Como afirma Demo, o Estado só garante cidadania se pressionado pelos interessados, quando há mobilização, reivindicação.
Mudanças ocorridas no Estado[2] e na sociedade civil[3] na forma de conceber e viabilizar a assistência, as políticas sociais contribuíram para o delineamento do sistema de proteção social brasileiro como denomina Draibe. Iniciando nos anos 30, com Getúlio Vargas e estendendo-se aos anos 80, políticas, programas e serviços sociais assumem novo formato na agenda do governo em relação ao enfrentamento da questão social. Passam a integrar a agenda da Reforma do Estado, devido às demandas da sociedade por justiça social e pressões oriundas de mobilizações corporativistas e clientelistas. Isso contribuiu para um reordenamento do Estado de Bem Estar Social, para a construção de um sistema de políticas sociais - limitado, ineficiente – mas que se consolidou mesmo sendo imperfeito e distorcido.(Draibe, s/d). As mudanças ocorreram na dinâmica, nas contradições e conflitos que permeiam a sociedade brasileira. Não poderia ser diferente, pois a política social é um objeto eminentemente dialético, contraditório, só podendo ser compreendida no confronto com o poder do Estado capitalista.
Os anos 80 foram palco de muitas lutas políticas, de defesa pelos direitos sociais, políticos e econômicos. Redesenhou-se um processo de transição democrática que produziu uma nova configuração no sistema brasileiro de proteção social apontado, sobretudo, na Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, pensar a assistência requer considerar o novo cenário social, político e econômico do Estado, onde estão imbricados novos valores, direitos, formas de governar, atores. Noutras palavras, considerar suas múltiplas relações. O que mudou após a democratização do país, a Constituição Federal (CF) de 1988, a aprovação da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) em 1993?
            A Constituição Brasileira expressa um novo paradigma de Assistência Social, considerada como “Direito do Cidadão e Dever do Estado”, assumindo assim o caráter de política pública, integrante da Seguridade Social, juntamente com a saúde e a previdência. A promulgação da LOAS  (Lei nº 8742, de 07 de dezembro de 1993)  normatizou o disposto nos artigos 203 e 204 da Constituição, redirecionando  suas bases em novas diretrizes, a descentralização e a participação popular e objetivos, como assegura  o texto constitucional[4].
 Os avanços político/jurídicos, na concepção da assistência não significaram uma implementação espontânea (automática) da referida política nas instituições, a dinâmica das entidades caminham lentamente em direção a mudança de paradigmas, sendo permeada por conflitos e resistências. Contudo, a legislação é um importante instrumento político para sua efetivação, pois está garantido em lei, o que requer dos atores envolvidos um conhecimento e comprometimento ético/político com essa nova forma de fazer assistência - trabalhando com e não para a população. 
            Devido traços historicamente demarcados (regime militar) por ações políticas autoritárias/ centralizadoras do Estado Brasileiro, incluindo diversos governos, torna-se imperativo na nossa sociedade um processo de reconstrução participativa e democrática que considere o saber e o fazer popular como elementos indispensáveis na consolidação deste novo paradigma da política de assistência social. Nesse sentido, a assistência - política pública - deve ser analisada como um dos elementos integrantes no processo de configuração do Estado Democrático de Direitos, lentamente construído por movimentos da sociedade civil e governo, através de acirradas lutas e disputas políticas, evidenciando, inclusive, os interesses econômicos defendidos por grupos políticos e de uma forma mais ampla do capital.
            A sociedade civil deve exercer o controle democrático sobre o Estado, participando, cobrando, exigindo seus direitos. Mas, como fazer isso?  De um lado, segmentos significativos da sociedade civil, uma grande maioria, não tem acesso à informação, desconhece seus direitos e os espaços institucionais de participação. Portanto, está geralmente excluída do processo de organização e mobilização popular. Do outro, a gestão pública deve assegurar o espaço nos canais de participação e controle público, mesmo que estes sejam ocupados por aqueles já estão incluídos, os que de alguma forma tem voz – fazendo ecoar suas demandas.  O governo municipal de Porto Alegre tem procurou imprimir um direcionamento popular, através da consolidação da articulação com representantes da sociedade civil nos espaços já legitimados e institucionalizados, como fóruns e conselhos municipais.


Nova concepção de assistência social
O novo paradigma da assistência social ultrapassa os limites do padrão convencional, tradicional, assistencialista vigente. Configura-se como uma política social que pode efetivamente contribuir para a consolidação dos direitos sociais e sua universalização. Esta nova visão está sendo construída, inclusive, na relação entre profissionais da assistência social e usuários desta política, proporcionando ações diferenciadas com novas formas de atendimento e participação popular. Não basta uma adesão teórica a uma nova concepção de assistência social, a um novo projeto político de sociedade sem que haja um comprometimento ético/político dos atores responsáveis por sua concretização.  A assistência deve ser a expressão de um projeto coletivo.
A construção de um novo projeto se produz no embate político traduzido no discurso e ação de diversos atores de entidades responsáveis pela assistência social. Contudo, não se rompe abruptamente com um modelo, há sempre resquícios do assistencialismo, convive-se com diferentes modelos (antigo e o novo) simultaneamente, - uma contradição necessária entre atores, ações e ideologias - na disputa política por novas formas de enfrentamento da pobreza, via a articulação das várias políticas públicas cujo modo de atuação foi expresso nos últimos anos.

A PROPOSTA DE REDE A PARTIR DA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
O sujeito/objeto de nossas inquietações são as ações políticas na área da assistência no município de Porto Alegre, cuja gestão municipal vem garantindo nos últimos anos um processo de participação popular. Foi criado em 1993 o Fórum Municipal de Assistência Social e organizada a I Conferência Municipal de Assistência Social onde se aprovou o Plano Municipal de Assistência Social e deliberou-se sobre o modus operandi de Assistência Social, centralizada em três pontos principais: concepção de Assistência Social; Sistema Municipal de Assistência Social e Gestão da Assistência Social.  Todo esse envolvimento delineou-se no processo de debate da sociedade em consonância com o projeto democrático-popular, assumido pelo governo.


A Fundação de Assistência Social e Cidadania[5] (FASC), órgão gestor da política de Assistência Social definiu as bases estratégicas com o objetivo de garantir a democratização da cidade, a qualificação dos serviços prestados e a qualificação das relações com setores organizados da população. Como a característica da Administração do Municipal e proposta de governo, investiu-se em aprofundamento do perfil popular junto à população não organizada, bem como a formação de rede de prestação de serviços, firmando parcerias que comprometessem as três esferas de poder, entidades privadas.
Conforme prevê a Lei Municipal nº 7414 de 1994 a FASC passa  ser responsável pelo planejamento, coordenação, supervisão e execução das atividades das unidades operacionais a seu encargo, em consonância com o Plano Municipal de Assistência Social e de forma a enquadrar-se ao desenvolvimento social e às aspirações da comunidade onde estão inseridas; articular e coordenar a política de assistência social em Porto Alegre, bem como gerir os serviços, benefícios e programas assistenciais em consonância com a Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS; garantir a execução do Plano Municipal de Assistência Social através da articulação dos órgãos governamentais e não-governamentais de Assistência Social.
A Fundação tem um novo direcionamento no período de 1997-2000, conforme deliberação da III Conferência Municipal de Assistência Social para consolidação da política municipal de assistência.  Desencadeia-se na fundação um processo de reordenamento institucional.  Técnicos da instituição debatem a questão da descentralização, a concepção e diretrizes da assistência social como política pública vinculada à seguridade social. Configura-se, então, a gênesis do novo modelo gerencial descentralizado que deveria considerar a capacidade criativa das comunidades e a própria ação dos técnicos visando a constituição da rede de assistência. Segundo Curtinaz (2002) o modelo de gerenciamento descentralizado nos coloca na fronteira do tencionamento, com a responsabilidade de representar a institucionalidade sem perder a criticidade de nossas ações. (p.101) A abrangência das gerências regionais respaldava-se na regionalização já existente do Orçamento Participativo e buscavam interlocuções que pretendiam tecer uma rede de atendimento, segundo Baptista (2000), o atendimento em rede se constitui pela articulação de um conjunto amplo e dinâmico de organizações diversas, em torno de interesses comuns, que realizam ações complementares em um processo unitário coerente de decisões, estratégias e esforços.
A FASC é responsável pela coordenação e execução dos programas e serviços de atendimento a população em situação de vulnerabilidade social desenvolvidos nos Centros Regionais de Assistência Social[6], nos módulos[7] de assistência social e em organizações não governamentais conveniadas com o município.
Para a execução da política foram criadas duas redes de serviços, denominadas de rede básica e rede especializada.
A rede básica da FASC é a rede de serviços que executa programas e serviços destinados à população que mantém laços familiares e comunitários, mas que está econômica e socialmente vulnerável[8].  Há nove centros regionais de assistência social e 14 módulos de assistência social e aproximadamente 250 organizações não governamentais conveniadas[9]. Segundo Guimarães (2002) esta rede insere-se nas comunidades e organiza-se regionalmente através dos Centros Regionais de Assistência Social e em módulos de assistência social. Outra modalidade é a rede especializada que atende a população que está em um maior grau de vulnerabilidade social, como crianças e adolescentes em situação de rua e adultos moradores de rua (...) Oferece atendimento de maior complexidade, exigido por esse público-como os abrigos – em locais estratégicos.[10]
O fortalecimento e consolidação da rede de atendimento descentralizada dos serviços constituíram-se elementos importantes no processo da implementação da assistência proporcionando visibilidade à política municipal de Assistência Social. Um dos principais programas hoje desenvolvidos é o Programa Família – apoio e proteção, integrado pelo NASF – Núcleo de Apoio Sócio - Familiar, implantado em 1994 é executado em nove centros regionais de assistência social e pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), implantado pela governo federal em 2000 é executado em Porto Alegre pela FASC.
Esta é uma das estratégias da FASC a descentralização da política de assistência social através de gerências regionais que buscava uma melhor articulação com os seguimentos sociais, usuários da política, entidades não governamentais e governamentais. Segundo Guimarães (2002) esse modelo deveria responder a uma identificação geográfica, administrativa, política e pedagógica que proporcionasse uma aproximação com instituições gerenciadoras dos serviços de assistência.
O objetivo do governo ao implantar a política de Assistência Social era romper com o assistencialismo, práticas paternalistas e conservadoras historicamente construídas e consolidadas nas políticas municipais, e ao mesmo tempo impulsionar práticas sociais orientadas por este novo paradigma da assistência, principalmente concernente à participação popular no processo de implementação, gestão e controle das ações de Assistência Social. Para tanto, era necessário garantir a hegemonia das forças políticas que apostavam em formas diferenciadas de enfrentamento da pobreza, garantindo a participação da população e contribuindo para sua emancipação social, ou seja, população como ator chave do seu processo de libertação. A questão do enfrentamento da crise brasileira não é só romper o emergencial na direção da efetivação de políticas sociais, mas de ter em conta principalmente às bases dessa consolidação. É trazer as forças populares para o cenário da decisão (Sposatti et al, 1987 p.25). A participação popular tem ocorrido através do envolvimento em canais de participação da comunidade como o Fórum de Orçamento Participativo, as Comissões Regionais de Assistência Social. Todos estes com representantes eleitos diretamente pela comunidade.

A EMANCIPAÇÃO DO SUJEITO PARA O FORTALECIMENTO DAS REDES
A inserção das forças populares no cenário de tomadas de decisões vem se construindo gradualmente. Percebe-se uma fragilidade histórica no processo de participação popular nos governos, considerando, sobretudo, os ranços autoritários de um passado recente cuja cultura e conjuntura favorecia a submissão, a obediência ao Estado e não a participação social. Contudo, o processo de democratização não garante por si só a participação. O povo, os interessados precisam ter uma ação pró-ativa, uma cidadania mais participativa, reclamando, exigindo seus direitos e cumprindo seus deveres.  Cobrar do Estado, fiscalizar suas ações, ou seja, exercer o controle social é dever do cidadão. Para tanto, é necessário produzir e disseminar informações.
Segundo Medeiros (2000) a informação é componente fundamental da qualidade e eficácia das ações individuais e coletivas, e mais do que isso, das eloqüentes dimensões da publicidade e do controle social quanto ao fazer público. (p.125). As informações, sobretudo, as mais técnicas, complexas devem ser socializadas com o povo, ter um alcance social, para que aquele tenha condições de participar, opinando, decidindo, controlando, o que poderá ser feito, principalmente, com informações. Esta gera possibilidades de uma participação popular diferenciada, capaz de argumentar, questionar. Sem informação reproduz-se o que Demo (2002) denomina de pobreza política - a condição de massa de manobra do pobre - ou por ele não saber criticamente que é pobre, ou por se ver como objeto de cuidados da elite, do governo e Estado, ou ainda, por não saber realizar um efetivo controle democrático sobre  mercado e Estado.
Participação requer consciência da sua importância. Portanto, é preciso conhecer, acessar, questionar, se informar para se ter conseqüentemente um envolvimento.  Para dentro e fora da nossa instituição, informar tem de ser concebido como sinônimos dos termos incluir, integrar, motivar, qualificar e responsabilizar. Medeiros (2000:126) Nesse sentido, o conhecimento transforma, modifica a visão e a ação do sujeito, não há neutralidade.  O povo precisa se ver como sujeito construtor de sua própria história, não ficar esperando do governo a solução para seus problemas. Isso não significa retirar do Estado seu papel social.  Assim com já se disse, ninguém educa ninguém, pode-se dizer – ninguém emancipa ninguém. O homem é construtor de sua própria libertação, embora ele não faça isso sozinho, ele precisa desejar se emancipar.
No seu extremo, politicamente pobre é quem espera a emancipação dos outros, sobretudo dos que a impedem. Primeiro erro é espera a emancipação dos outros, mantendo-se objeto do cuidado dos outros e deixando de perceber que o verbo emancipar só pode ser reflexivo, ou seja, emancipar-se. (...) Segundo erro é esperar a emancipação logo dos que a impedem, enredando-se na malha da incapacidade de perceber criticamente que a pobreza é injusta, imposta, cultivada. (Demo, 2002:78)
      A política de assistência social deve objetivar uma emancipação do seu público alvo. Contudo, por si só ela não garante isso. É necessária a construção de um projeto ético político coletivo, cujos fundamentos estejam ancorados numa visão libertadora, problematizadora que tenha a população como sujeito, configurando-se um processo de interação entre diferentes atores numa relação edificante de informação e conhecimento, onde a população faz a leitura da sua própria realidade. Pois como já foi dito, sem informação não é possível participação. Esta deve circular os espaços institucionais possibilitando tratar de várias dimensões na área da assistência passando pela tomada de decisão até sua implementação. Investir na informação e fazer dela um eixo de gestão, não significa dar a conhecer um corpo de dados ao qual só determinados setores privilegiados têm acesso.  A dificuldade inicia na inexistência de um sistema de informações consolidado (Medeiros, 2002:124)
Uma visão emancipatória procura maior relação e diálogo, com os saberes locais e os diferentes atores, é realizada em um contexto histórico e social, que pressupõe o conhecimento da realidade.  Além disso, quando o trabalho é executado em rede, trata-se de buscar a superação da fragmentação das atuações sociais dos sujeitos e suas implicações para a vida do homem e da sociedade. O processo ligado a uma visão emancipatória luta contra formas instituídas e os mecanismos de poder e alienação, deslegitimando as formas institucionais, propiciando assim a argumentação, a comunicação e a solidariedade, bem como o contraditório.
Para compreender uma visão emancipatória e a concretização do trabalho em rede é necessário um processo de vivência democrática à medida que todos os segmentos sociais que participem, construindo assim possibilidades de modificar sua própria realidade, devendo apostar em novos valores, respeitando a singularidade do sujeito, em vez da padronização, em vez de dependência, construir a autonomia; em vez de isolamento e individualismo, o coletivo e a participação; em vez da privacidade do trabalho individual, propor que seja público; em vez de autoritarismo, a gestão democrática; em vez de cristalizar o instituído, inová-lo; em vez de qualidade total, investir na qualidade para todos.
Por um lado, a visão emancipatória é um meio que permite potencializar o trabalho colaborativo e, portanto fortalecer uma rede de compromisso com objetivos comuns; por outro, sua concretização exige rupturas.

Conceitos de rede, comparações, VISÕES.
O processo de implementação de rede de assistência no município de Porto Alegre expressa um modelo ainda embrionário de compreensão de redes, no entanto, não apresenta uma noção da real complexidade da atuação em rede. A necessidade de construir um modelo para o enfrentamento das nuances do capitalismo, principalmente relacionadas à exclusão social dos direitos básicos do “cidadão” não expressa em sua complexidade os conceitos de rede. Na compreensão das redes, precisamos considerar ainda os aspectos geográficos, sistemas produtivos, circulação de produtos, circuitos de cooperação, pois suas atuações são importantes para compreendermos a complexidade da rede.
Para Santos (1996), as cidades são definitivamente como pontos nodais, onde estes círculos de valor desigual se encontram e superpõem. A rede urbana se torna, assim um fenômeno, ainda mais complexo, definido por fluxos de informação hierarquizados e fluxos de matéria, que nas áreas mais desenvolvidas não são hierarquizantes.
Portanto, as redes contem elementos como informações, mensagens e ordens, hierarquizados ou não. Estas questões nos traduzem as diversas possibilidades que se fazem presentes sob o prisma da assistência social enquanto política publica e a necessidade das conexões e articulações de uma pressuposta atuação em rede, problemas estes que extrapolam o território local, problemas gerais, relações cidade-campo; relações interurbanas; e organização interna das cidades e os novos papéis da metrópole.
A atuação em rede perpassa e ultrapassa o limite local, o que não implica possibilidades do surgimento de sistemas que garantam em alguns aspectos mecanismos compensatórios, capazes de dirimir as relações do capital e trabalho.
O anseio e a necessidade dos agentes políticos instituírem processos para qualificarem as ações das políticas públicas, os levou a implementação de conceitos restritos ao senso comum. Isto não significa o desmerecimento da iniciativa, mas a constatação de que muitas vezes as ações políticas desconsideram os conceitos técnicos, prevalecendo o político, quando deveria haver uma complementariedade. Cabe ressaltar que a incitativa garante a intenção dos agentes de tecer uma rede que vai além dos serviços de assistência, ainda que, “isentos” de conotação teórica cientifica. Segundo SOUZA SANTOS (2002) é uma outra forma de olhar, o senso comum, não inferior à ciência, mas como parte integrante da mesma. Ressalta ainda suas virtualidades: a praticidade, a transparência, a evidência, a indisciplinaridade e espontaneidade desta noção. Neste sentido, ocorre o que autor citado denomina de senso comum esclarecido.
É importante ressaltar que a proposta de rede em Porto Alegre é uma forma de atuação diante da realidade local, de compensar a inércia do Estado. Contudo, a visão de totalidade, de mundo, da configuração da sociedade quando desconhecida afeta a intervenção da ação social dos agentes que implementam a política. Quando eles se vêem isolado da natureza, da compreensão global, do espaço local, dos aspectos culturais e econômicos, considerando-se como algo exterior a eles, estão separando o sujeito do próprio ambiente e de sua realidade, o observador do fato observado e desenvolvendo um olhar viciado, dominante e linear que divide, separa e reduz. Isso não contribui para o entendimento de atuação em rede, de sua complexidade, da própria realidade. 
 A modernidade da ciência, segundo Latour (1994) evidencia um corte epistemológico entre conhecimento exato e exercício do poder, natureza e cultura insistindo num isolamento, isto é, separando os homens, as coisas e os discursos.  Contudo, outros olhares têm se lançado sobre o real, entre estes se pode situar as redes. É o que autor denomina de TECIDO INTEIRIÇO, das naturezas e culturas ao mesmo tempo real, social e narrada. As redes são ao mesmo tempo reais como a natureza, narradas como discurso, coletivas como a sociedade. (op.cit. 11)
O foco das redes é a interação, unidade, totalidade que está vinculada à noção de complexidade e de dialética. A dialética, segundo MARX apud SEVERINO (1986), aponta que a realidade vai se produzindo permanentemente através de um processo de mudança determinado pela luta dos contrários, por força da contradição que trabalho o real, no seu próprio interior.
 De outro lado, o princípio da complexidade é juntar, unir, dialogar, comunicar distintas dimensões como a física, biológica, cultural, sociológica, histórica. Como afirma Morin (2003) a natureza da ciência é ao mesmo tempo social e política, física, biológica, cultural, social histórica de tudo que é humano (p.31). Complexus é tecido junto.[11]  As noções de Redes em Latour e de Complexus em Morin coincidem significando inteireza, totalidade, unidade,  aquilo que não se pode separar. Tecido junto = sentido inteiriço.
            Não há unanimidade quando se fala em redes. Todavia percebe-se a intenção da idéia de tecido junto, de interação. Como se aponta na definição a seguir sobre rede.
Trata-se de um tecido de relações e interações que se estabelecem com uma finalidade e se interconectam por meio de linhas de ação ou trabalhos conjuntos. Os pontos de rede podem ser pessoas, instituições ou grupos. Os diferentes tipos de redes têm uma função na vida de cada pessoa(...).[12]
A assistência social como política pública está imersa num conjunto de relações e deve ser analisada neste prisma. As redes sociais possibilitam a ação solidária em situações adversas e diversas, podendo ser viabilizada pelo Estado e/ou sociedade civil, mas não se restringem as dimensões sociais. As redes de colaboração solidária podem ser consideradas sob os aspectos econômicos, político e cultural.
  
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Optamos referenciar a implementação da rede de assistência social em Porto Alegre, por se uma iniciativa inovadora e com o caráter de romper com a visão fragmentada das ações das políticas públicas. Para isso, tomamos como referência conceitos que vão do senso comum a complexidade de redes. A idéia é de fomentar o debate sobre a constituição de redes de assistência, tendo esta como propulsora de um novo modelo de intervenção social. Buscando a articulação e responsabilização dos agentes que viabilizam as demais políticas. Os autores com os quais dialogamos apontam para uma compreensão de redes que perpassa o espaço local, e conduz para um processo de emancipação do sujeito contribuindo para provocar uma ruptura de visão conservadora da ciência.

O modelo implementado no município de Porto Alegre apresenta uma configuração denominada como redes de serviços da assistência social. Portanto, trata-se uma concepção embrionária, necessitando de uma maior articulação entre agentes, sujeitos, espaços geográficos, questões culturais, econômicas, políticas, e sociais. A proposta da assistência  social com funcionamento em rede  pressupõe,  segundo DURO GUIMARÃES (2002), atuação conjunta da concepção de direito enquanto cidadão, do serviço como uma forma de enfrentamento as questões sociais e a integração das políticas e da própria comunidade em sua relação com outras entidades. a transforma

O termo rede utilizado na política municipal de assistência passa a idéia de cooperação, de existência de serviços. Trata apenas da noção de articulação dos serviços e não pressupõe o conceito mais complexo de rede. A noção que permeia o entendimento de rede no município de Porto Alegre reforça a importância da assistência social como uma política publica de dever do Estado e direito do cidadão. Está condicionada a uma estrutura, política, ideológica de Estado e articulação com os diversos segmentos sociais. Justifica-se a intenção, pois a política é a tradução dos anseios e necessidade de determinados segmentos sociais, através de propostas inovadoras. Por isso, a idéia da necessidade de conexão e articulação destes segmentos propõe um novo modelo para o enfrentamento da pobreza e, por conseguinte, a emancipação do sujeito.

Construir novos paradigmas e conceitos passa por um debate cultural e ideológico na sociedade para romper com a lógica da estrutura capitalista que reforça o individualismo, onde os sujeitos são tratados como mercadoria. A idéia e iniciativa de redes para os serviços de assistência social propiciam um espaço de polemização no conjunto da sociedade que contribui para a construção de uma cidadania emancipatória. Este debate é incipiente, pois a noção de rede deve ultrapassar o micro espaço de redes internas e locais. Objetivando tecer uma rede de global de solidariedade para enfrentar a barbárie.


Referências Bibliográficas

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BAPTISTA, Myriam Vera. Planejamento social: intencionalidade e instrumentação. São Paulo. Veras Editora. 2000.
DEMO, Pedro.  Complexidade e Aprendizagem: a dinâmica não linear do conhecimento. São Paulo, Atlas, 2002.
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COUTINHO, Carlos Nelson. Marxismo e Política: a dualidade de poderes e outros ensaios. São Paulo: Cortez, 1996.
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GUIMARÃES, Jorge Francisco de Oliveira. A experienciação do paradigma:o desafio da gerência regional in Iº Seminário de Práticas Sociais – Troca de Experiência . Fundação de Assistência Social e Cidadania - FASC. Porto Alegre, RS. Brasil, 2002.
LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos: ensaio de antropologia simétrica. Rio de Janeiro: Coleção TRANS, 1994.
LEI ORGÂNICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – LOAS – n° 8.742 de 7 de dezembro de 1993.
LEI MUNICIPAL n° 7.414 de 1994 – Porto Alegre –RS
LEI MUNICIPAL n° 8.509 de 07 de junho de 2000 –  Porto Alegre –RS
MEDEIROS, Márcia de Souza. A batalha da informação in Iº Seminário de Práticas Sociais – Troca de Experiência . Fundação de Assistência Social e Cidadania- FASC. Porto Alegre, RS. Brasil, 2002.
SANTOS, Milton. Técnica Espaço Tempo. Globalização e meio técnico-científico informacional. São Paulo, Hucitec, 1996.
SANTOS, Boaventura de Souza. Um Discurso sobre as Ciências. Porto, Afrontamento, 2002.
__________. Introdução a uma Ciência Pós-Moderna. Rio de Janeiro: Graal, 1989.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Educação, ideologia e contra ideologia. São Paulo: EPU, 1986.
SPOSATI. Aldaíza de Oliveira. A assistência na trajetória das políticas sociais brasileira. São Paulo: Cortez, 2003.
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FASC. Fundação de Assistência Social e Cidadania. Manual de Assistência Social/ 1995, p. 8    (mimeo)
COUTINHO, Carlos Nelson in www.artnet.com.br/gramsci/arquiv93.htm




[1]  Administração Popular era a composição da coligação política. Em 1992, PT, PPS,  PSB, PV e PC. 1996 PT, PCB e PPS e 2000, PT, PCB, PSB, PC do B.

[2] O Estado não é um neutro, expressa fortemente o seu caráter ideológico. Como afirma Coutinho (1996), o Estado é um Estado de classe: não é a encarnação da razão universal, mas sim uma entidade particular que, em nome de um suposto interesse geral, defende os interesses comum de classe particular.(p.19) Para Marx, o Estado é visto como um comitê de classe, exercendo seu poder de opressão para defender os interesses da classe dominante, controlar os conflitos sociais entre diferentes interesses econômicos.
[3] "Sociedade civil" é uma arena privilegiada da luta de classe, uma esfera do ser social onde se dá uma intensa luta pela hegemonia; e, precisamente por isso, ela não é o "outro" do Estado, mas - juntamente com a "sociedade política" ou o "Estado-coerção" - um dos seus inelimináveis momentos constitutivos.(COUTINHO, 2005)
[4] Art. 203 - A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; Art. 204 - As ações governamentais na área da assistência social serão (...)organizadas com base nas seguintes diretrizes: I - descentralização político-administrativa II - participação da população, por meio de organizações representativas.

[5] A política de assistência social em Porto Alegre acompanha a forma de gestão proposta pela  LOAS, cap III, art 6° de um sistema descentralizado e participativo. Portanto, a configuração do processo de implementação da referida política vincula-se a um novo ordenamento da assistência social, cujo marco político/jurídico ocorreu definitivamente com a promulgação do Projeto de Lei nº 7414, aprovado na Câmara Municipal de Vereadores de Porto Alegre em abril de 1994.
[6] Os Centros Regionais de Assistência Social estão localizados em regiões geopolíticas da cidade, e são responsáveis pela execução de serviços e supervisão dos programas de assistência social desenvolvidos pelas entidades conveniadas.
[7] Módulos são equipamentos descentralizados que executam serviços e programas de assistência social e estão vinculados aos Centros Regionais de Assistência Social.
[8] Portal da Prefeitura de Porto Alegre.  www.portoalegre.rs.gov.br/fasc.
[9] Idem
[10] Ibidem
[11] Edgar MORIN  não  foi o pai do vocábulo complexus. A idéia está relacionada a teoria da informação e da cibernética ( anos 50) que  passaram a fornecer uma nova perspectiva teórica que se podia aplicar ao mesmo tempo à máquinas artificiais, aos organismos biológicos e aos fenômenos psicológicos e  sociológicos.  Porém, teve o papel do grande artesão do pensamento complexo  e  da idéia de complexidade. ( ALMEIDA, 2002)
12 Conceito extraído do texto baseado  no documento:Redes Locales Frente a la Violencia Familiar - Série: Violencia Intrafamiliar y Salud Publica. Documento de Análise nº 2. La Asociación de Solidaridad para Países Emergentes (ASPEm) / OPAS, Perú, Junho de 1999.


29 março, 2012

Martin Luther King: 44 anos de martírio...

   Há exatos 44 anos, no dia 4 de abril de 1968, Martin Luther King foi assassinado aos 39 anos de idade. Para aqueles que pouco conhecem sua história, é importante destacar: King foi um ícone da luta por igualdade e paz, cujos ideais mobilizaram multidões.

Ele foi um grande líder, que lutou incessantemente pelos princípios de liberdade, igualdade e direitos civis nos Estados Unidos. Pelo seu combate pacífico contra o preconceito racial, recebeu o Prêmio Nobel da Paz. Mas sua trajetória foi breve: foi assassinado por um branco segregacionista aos 39 anos.

O movimento começou com Rosa Parks, passageira que se recusou a ceder seu lugar no ônibus a um branco e foi presa por desacato às leis segregacionistas. A luta de Martin Luther King pelos direitos civis teve início no episódio conhecido como “Milagre de Montgomery”, em 1955. Como presidente da Associação de Melhoramento de Montgomery, King liderou, junto com a comunidade, um boicote às empresas de ônibus da cidade. O ato discriminatório contra Parks trouxe a questão racial ao debate nacional, e o movimento durou um ano, pressionando o Estado a abolir a segregação nos transportes públicos — decisão confirmada pela Suprema Corte Americana.

Em seguida, King liderou uma série de protestos em diversas cidades contra a segregação racial em espaços públicos. Na década de 1960, os negros conquistaram acesso a bibliotecas, parques e lanchonetes. Na mesma época, os EUA enfrentavam lutas de classe, greves e conflitos militares no mundo inteiro, mas a causa de King se destacou pelo combate pacífico ao racismo.

A Marcha para Washington

Em 1963, Martin Luther King liderou a Marcha para Washington, reunindo mais de 200 mil pessoas em um movimento pelo fim da segregação racial. Na ocasião, proferiu o célebre discurso “Eu tenho um sonho”, clamando por uma sociedade de liberdade e igualdade.

Aos 35 anos, King recebeu o Nobel da Paz, sendo o mais jovem ganhador do prêmio. Sua luta pela não-violência se deu por meio de resistência firme, mas pacífica. Ainda assim, enfrentou prisões, críticas duras e ameaças constantes.

A batalha pelos direitos civis avançou com a aprovação da Lei dos Direitos Civis, em 1964, garantindo igualdade de direitos, seguida da Lei dos Direitos de Voto, em 1965. King também lutou por oportunidades de emprego para os pobres e, em 1967, uniu-se ao movimento contra a Guerra do Vietnã.

Assassinato e Legado

Martin Luther King foi assassinado em 4 de abril de 1968, em Memphis. Sua luta, no entanto, marcou a história da humanidade e influenciou o fim do Apartheid na África do Sul. Seu legado permitiu que, na primeira década do século XXI, o mundo testemunhasse a eleição do primeiro presidente negro dos Estados Unidos, Barack Obama.

Temos um sonho — e a luta continua!

No Brasil e no mundo, manifestações de racismo persistem, com crimes bárbaros motivados pela questão racial. Segundo o Mapa da Violência 2011 – Os Jovens do Brasil, jovens negros, especialmente homens, estão entre as principais vítimas de mortes violentas, evidenciando o componente racial dessas tragédias.

Fundação Palmares

No Brasil, a Fundação Cultural Palmares tem como missão combater o racismo e promover políticas afirmativas que valorizem a cultura negra. Com o Estatuto da Igualdade Racial e ações integradas com órgãos governamentais e sociedade civil, busca fortalecer a identidade dos afrodescendentes no país e no mundo. Neste ano, em menção internacional aos Povos Afrodescendentes, Luther King inspira o combate contra a discriminação.

Violência racial é violação de direitos humanos. A luta pela igualdade e liberdade não pode parar!

Perfil de Martin Luther King

Martin Luther King nasceu em 15 de janeiro de 1929, em Atlanta, no sul dos Estados Unidos, região marcada pelo segregacionismo. Filho e neto de pastores, cresceu em um ambiente de fortes convicções políticas e religiosas, tornando-se pastor batista aos 19 anos. Formou-se em teologia pelo Seminário Teológico Crozer e, em 1955, concluiu o doutorado em filosofia pela Universidade de Boston.

Defensor da paz e da não-violência, King foi inspirado pelas ideias do líder indiano Mahatma Gandhi e dedicou sua vida à luta contra a discriminação racial e pela justiça social.

17 setembro, 2011

Vivos, atentos e mobilizados - O DIA NACIONAL DA CONSCIÊNCIA NEGRA

     A comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra continua a oferecer uma oportunidade para examinarmos conceitos e pré-conceitos de muitos acerca do significado dessa data e de outras que afirmam a brasilidade do nosso povo. O artigo publicado no jornal O Globo, intitulado “Distraídos, mataremos” (15/11/2007), evidencia a persistência do domínio branco sobre a possibilidade de construirmos uma nação livre de racismo.

Vale lembrar a afirmação de Boaventura Sousa Santos em seu livro Toward a Multicultural Conception of Human Rights (1997), que nos ajuda a pensar em um imperativo social no contexto de políticas de democratização do acesso que contemplem as diferenças: as pessoas têm direito a ser iguais sempre que a diferença as tornar inferiores; e têm direito a ser diferentes sempre que a igualdade colocar em risco suas identidades.

Em 2001, realizou-se, em Durban, África do Sul, a 3ª Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância, promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU). Parece que o autor do artigo desconhece esta conferência ou a ignora deliberadamente. Muitos acadêmicos expressam pensamentos conservadores e conceitos racistas sob a aparência do academicismo, tentando ocultar um racismo velado que ecoa nas favelas, no sistema penitenciário e nas estatísticas socioeconômicas, evidenciando uma frágil democracia racial.

Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelam uma combinação perversa que associa fracasso escolar, pobreza e marginalização social. Entre jovens negros de 15 a 19 anos, a taxa de analfabetismo é de 9,1%, contra 3,7% entre os jovens brancos. Entre mulheres, o contraste é ainda mais marcado: 4,2% das mulheres negras são analfabetas, frente a 1,9% das mulheres brancas, evidenciando a dupla discriminação no mercado de trabalho.

Alguns temas despertam polêmica, especialmente quando se referem a datas comemorativas que tratam da liberdade, do respeito humano, da opressão, do genocídio fragmentário e do racismo. Essas discussões não podem ocorrer isoladamente, como muitas vezes vemos em diferentes esferas da sociedade e até no meio acadêmico. Evitar ou desqualificar esse debate é uma estratégia de quem se opõe a discutir o preconceito racial. As datas comemorativas devem ser analisadas no contexto das políticas de ações afirmativas, que buscam combater desigualdades sociais e raciais no Brasil.

Na Conferência de Durban, o Brasil comprometeu-se internacionalmente com a luta contra a discriminação racial, estabelecendo ações voltadas para o desenvolvimento de políticas de ações afirmativas para a população negra brasileira. Essas medidas, implementadas pós-Durban, representam estratégias concretas de combate às desigualdades raciais e, ao serem aplicadas, contribuem também para o enfrentamento das desigualdades sociais.

A desigualdade racial no Brasil não é fruto de uma fatalidade histórica, apesar da naturalidade com que a sociedade a encara. No país, o negro não é discriminado apenas por ser pobre, mas também por ser negro. Classe social, renda e grau de instrução podem atenuar o racismo, mas jamais eliminá-lo.

As datas comemorativas são uma das estratégias de ação afirmativa. Elas proporcionam visibilidade e evidenciam processos históricos e estruturais de discriminação que afetam determinados grupos sociais e étnico-raciais. Talvez seja por isso que tais datas incomodem a sociedade brasileira e alguns acadêmicos, ao desvelarem a crença de que somos uma “democracia racial” e a ideia equivocada de que resolver a questão socioeconômica basta para eliminar a desigualdade racial.

Por isso, seguimos vivos, atentos e mobilizados — mulheres e homens, negros, brancos e indígenas —, mantendo o rumo na perspectiva de uma sociedade humanamente diversa, socialmente justa e verdadeiramente democrática, que reconheça as desigualdades perversas de raça, etnia e gênero.

Venceremos!

16 março, 2011

O apartheid no carnaval de Salvador


Todos sabemos que o carnaval é a festa mais popular do Brasil. Em Salvador, ele envolve o povo brasileiro e atrai milhares de visitantes do mundo todo. Correr atrás do trio elétrico nos circuitos Barra/Ondina ou Campo Grande é, sem dúvida, uma experiência inesquecível, mas é uma memória que nem todos podem vivenciar da mesma forma.

Salvador tem cerca de 80% de população negra, mas essa realidade não se reflete nos grandes blocos. O carnaval da cidade, cada vez mais mercantilizado, é feito para turistas e foliões de fora, em sua maioria brancos. O preço dos abadás varia de R$ 200 a R$ 1.500, tornando inacessível a participação da maioria da população local. Quem sustenta a festa nos bastidores são os “cordeiros” e foliões da pipoca, trabalhadores que seguram a corda dos blocos, garantindo acesso e segurança para os que pagam caro para se divertir. Esses trabalhadores recebem cerca de R$ 25, um suco e um pacote de biscoito, percorrem o trajeto sob sol intenso, ruas sujas e risco de contaminação, enquanto os foliões desfilam bem calçados e vestidos com roupas de grife.

Historicamente, o carnaval da Bahia nasceu da resistência negra e das tradições afro-brasileiras. Os negros, descendentes de escravizados, foram os responsáveis por criar a música, a dança, os ritmos e a alegria que hoje fazem do carnaval de Salvador um espetáculo reconhecido mundialmente. Manifestações como o afoxé, o samba de roda e os blocos afro nasceram da necessidade de afirmar identidade, resistir à opressão e celebrar a ancestralidade. No entanto, essa contribuição fundamental muitas vezes não encontra espaço de protagonismo nos grandes blocos de axé music e trios elétricos, que privilegiam o consumo, o turismo e a visibilidade midiática.

O apartheid no carnaval de Salvador é evidente: de um lado da corda, 99% de brancos se divertindo; do outro, negros trabalhando em condições precárias, sem segurança nem remuneração justa. Essa segregação não é apenas física: é social, econômica e racial. A exclusão do negro do centro da festa simboliza a persistência de desigualdades históricas, mesmo em uma celebração que nasceu de sua própria cultura. A festa que deveria celebrar diversidade, resistência e identidade afro-brasileira hoje evidencia exclusão, discriminação e marginalização de quem fez e ainda faz do carnaval um patrimônio cultural mundial.

Salvador dança, mas nem todos têm direito a festejar. O carnaval é da cidade, mas não é do povo negro. Enquanto uns celebram com conforto e visibilidade, outros trabalham invisíveis, garantindo que a alegria continue, mesmo à custa da sua própria dignidade. Como diria o poeta: de um lado, o carnaval; do outro, a fome, a desigualdade e a injustiça.


30 novembro, 2010

Troca de elite, mas os inimigos ainda são os mesmos!

Ricardo Crô é escritor e compositor
Qui, 25 de novembro de 2010 15:59


Não tarda, nem falha. Em pouco tempo os efeitos colaterais dessa belicosa, midiática e ineficiente "política de segurança" do governo Cabral, estão sendo detectados. Aliás, por aqui não existe o que podemos chamar de política de segurança pública. O que se pratica com vigor renovado é a criminalização da pobreza, como costumam dizer alguns estudiosos. Aqueles poucos que ainda guardam um mínimo de senso crítico. Esses mesmos que não costumam se inebriar pelo canto da sereia, encantando-se com os choques de ordem, nas suas mais diversas feições. Uns e outros que encaram os fatos, de frente, sem lançar mão do discurso fácil, eleitoreiro e mais palatável. Remando na contracorrente do "opinionismo" distorcido de parte da sociedade apavorada e da mídia grande que, notadamente interessada, fornece parte do suporte necessário para a proliferação de políticas elitistas e segregadoras.

    Esta bandeira também é minha porque Sepé Tiarajú defendeu seu povo contra a colonização dos espanhóis e portugueses. Esta bandeira é mi...